quinta-feira, 31 de janeiro de 2019

Contribuições Psicopedagógicas aos Estudantes Diagnosticados com TDAH (Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade): Como Ajudar os Educandos com a Produção Textual



“A educação é direito social, valor mínimo de uma sociedade que se pretende justa, livre e solidária, nos termos da Constituição da República (ECA Comentado).

“O impacto sobre a aprendizagem escolar é tamanho que demanda a garantia de direitos desses estudantes no contexto da educação inclusiva” (Rotta, Ohlweiler, Riesgo).



O TDAH (Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade) constitui um assunto que começou a chamar a atenção da comunidade científica no ano de 1900. Nesse primeiro momento, a terminologia ainda não existia. O que ocorria era o interesse de pesquisadores por certo grupo de crianças, aparentemente com funcionamento cognitivo normal, porém que apresentavam características próprias quanto às suas condições motoras, pois eram mais agitadas, em comparação às outras crianças da mesma idade. Em 1966, Clements classifica essa condição como “Déficit de Atenção”. Posteriormente, a OMS (Organização Mundial da Saúde) passa a incluir a classificação no CID-9. Segue-se a isso a inclusão do transtorno do déficit de atenção, com ou sem hiperatividade, no DSM-3, em 1980. Na versão deste manual lançada no ano de 1987 é utilizada a expressão “distúrbio de déficit de atenção e hiperatividade”. A partir do ano de 1994, a descrição do transtorno passa a conter os aspectos tanto da hiperatividade quanto da desatenção (Rotta, Ohlwelar, Riesgo, 2016).   
O fato é que a pessoa com sintomas de TDAH (Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade) encontra prejuízos em seu funcionamento não apenas na infância ou no aprendizado escolar. As mesmas condições podem se estender até a vida adulta. Em decorrência da presença dos critérios que caracterizam o transtorno, o sujeito experimenta comprometimentos em diferentes áreas de funcionamento, como o aprendizado formal, o campo profissional e no âmbito dos demais relacionamentos sociais. Não recebendo atenção durante a infância e por não se sentir adequada àquilo que os demais esperam dela, a criança desatenta e/ou hiperativa poderá estabelecer relacionamentos com quaisquer grupos pelos quais se sinta aceita, possibilitando o risco de se envolver em comportamento delinquente. Na vida adulta, as características do transtorno poderão ocasionar outros riscos, como abuso de álcool e drogas, dificuldades na área profissional e risco de se envolver em acidentes de transito (op.cit. p. 276).
Os aspectos anteriores indicam como o TDAH (Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade) costuma estar acompanhado de prejuízos em diversas esferas da vida do sujeito, seja criança ou adulto. Em decorrência disso, poderemos supor que a melhor intervenção deveria ser realizada de modo preventivo, já durante os anos iniciais da infância.
Uma vez que a trajetória escolar representa etapa importante para o desenvolvimento integral e harmonioso do sujeito, a necessidade de adequações pedagógicas e ambientais no ambiente escolar poderá proporcionar as melhores condições possíveis para a continuidade dos progressos na aprendizagem daquelas crianças que possuam os critérios para o transtorno.

Adequações Necessárias

Pelo fato de encontrar dificuldade para sustentar a atenção durante a realização de atividades extensas, a pessoa que apresente os critérios para TDAH pode apresentar prejuízos em sua aprendizagem. Essa condição faz necessária a estruturação do ambiente escolar.

Investindo na Melhora da Comunicação com o Educando

A comunicação entre educador e educando é um tópico de grande relevância para a oferta de adequações pedagógicas efetivas. Nesse sentido, é importante que os professores se questionem, após as orientações feitas, sobre se o educando compreendeu corretamente o que deverá fazer. Esse posicionamento dos educadores inclui a ênfase nos aspectos metacognitivos (sublinhar e resumir informações, realizar autocorreção, etc), podendo refletir positivamente no nível de compreensão e aprendizagem dos assuntos alcançados pelo educando. Por exemplo, a produção de um texto pode ser algo muito natural para alguns alunos, mas a criança com os critérios de TDAH (Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade) poderá achar mais fácil realizar o que se pede se o tipo de texto que deverá produzir for explicado conforme a sua tipologia específica. Outra ação importante no aspecto comunicacional inclui oferecer informações de modo objetivo (frases breves). Além disso, demais estratégias pedagógicas poderão incluir o uso de recursos multissensoriais (quadros ilustrativos, música, tecnologias).
Parte do processo de comunicação pode ser considerado também o momento em que o educador oferece feedback ao educando. Nesse sentido, o elogio, oferecido imediatamente ao alcance de determinado objetivo pedagógico, poderá servir para encorajar o educando, para que não se sinta desestimulado diante dos grandes desafios pedagógicos que percebe estarem diante de si. Com a prática do elogio realizada no momento adequado, estimula-se a que o educando encontre um novo significado em seus esforços para aprender.  

Adequações de Tempo e de Espaço da Sala de Aula

No espaço da sala de aula, algumas situações serão experimentadas como ainda mais desafiadoras. O tempo possui uma dimensão subjetiva. Uma atividade de que gostamos causa-nos a impressão de ter transcorrido rapidamente. Quando enfadados, parece que o tempo passa devagar. Caso o espaço escolar não contribua para que o educando experimente êxito em seus esforços, este poderá vivenciar esse local de uma maneira que pouco poderá contribuir com os objetivos educacionais da instituição. Assim, se o educando se sentir confuso diante de diversas situações pedagógicas em que encontre dificuldades para administrar sozinho, poderá sentir desestimulado. Para que essa situação não ocorra, será necessário investir na elaboração de estratégias que o ajudem a se organizar, em relação ao tempo e ao espaço de suas aprendizagens. Na sala de aula, por exemplo, a distração poderá ser controlada se o educando estiver sentado mais próximo do professor, facilitando a intervenção e minimizando os efeitos de estímulos concorrentes sobre o foco atencional. A oferta de tempo adicional para a realização das atividades em que o educando encontre maior dificuldade poderá ser outra ação necessária. Lembrar as datas e os prazos para a entrega de trabalhos poderá contribuir tanto para que não ocorram perdas de prazos quanto para que o trabalho não seja feito na última hora.

Parceria com a Família

A parceria com as famílias de educandos diagnosticados com o TDAH (Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade) será de grande ajuda para minimizar os efeitos das características que costumam acompanhar esse diagnóstico. Muitas vezes, essas crianças pertencem a famílias que dispõem de pouca informação sobre o transtorno. É importante deixar claro para a família que não se trata de preguiça. Muitas vezes o educando realmente deseja fazer bem feito. Sem receber a ajuda adequada da escola e da família, a criança poderá desanimar. A parceria com a família poderá contribuir para que a rotina do educando seja estruturada, ajudando-o a se organizar, para que disponha de tempo o suficiente para os estudos das tarefas para casa. Em parceria com a escola, as famílias podem ser orientadas a dar feedback positivo, reconhecendo os esforços realizados pelo educando.  

Adequações Relacionadas À Produção Escrita

O educador deve estar ciente de que a atividade de escrita é complexa. Portanto, a produção de textos seria mais proveitosa oferecendo a oportunidade de que o educando possa se concentrar em uma atividade de cada vez. Por exemplo, poderia ser oferecido tempo para que o educando possa escrever, inicialmente, deixando a correção textual da ortografia para um momento posterior. O que pode parecer simples, para uma criança em condições de atenção adequada, poderá ser muito desafiador para uma criança com dificuldades atencionais acentuadas. Assim, a intervenção do educador será de grande ajuda. Por exemplo, dividindo a atividade em momentos para planejar, escrever e revisar as produções textuais.
Essas intervenções podem ser justificadas por pesquisas atuais que demonstram que os textos produzidos por crianças que possuem o diagnóstico de TDAH costumam apresentar características distintas (maior quantidade de erros ortográficos, frases mais curtas, dificuldades na sintaxe). Para a oferta de outras adequações na produção de textos, o educador poderá, ainda, minimizar o número de tarefas que exijam cópias escritas extensas e, quando possível, considerar as respostas oralmente.
É interessante considerar que uma das estratégias educacionais atuais para gerar a produção de ideias seja exatamente a elaboração de mapas conceituais (mapas mentais) (DELL”Isola, 2011). Ao fazer uso de mapa conceitual, o educador poderá incentivar o educando a iniciar não pela escrita de frases completas, mas apenas pela produção de ideias. A partir da escrita da ideia principal, no centro da página, saem outras ideias, que vão se ramificando, se subdividindo. Em vez de escrever as ideias por meio de frases completas, o planejamento ocorreria apenas pela escrita de palavras ou expressões curtas, por meio da produção do mapa conceitual. Assim, o momento inicial seria simplificado, e o processo mais complexo de escrita ocorreria em seguida. Isso contribui para que o educando aprenda a se organizar de acordo com o tema daquilo que lhe foi solicitado. A possibilidade de ser instruído a construir mapas mentais contribuiria para simplificar o processo inicial, que é o de planejamento.

Considerações Finais

Por fim, é preciso ter claro que, crianças diagnosticadas com TDAH não são todas iguais e precisam de atenção individualizada para a elaboração de uma intervenção adequada. Assim como nos demais casos de diagnóstico, não é possível realizar uma intervenção eficiente sem conhecer o educando individualmente. Uma boa maneira de iniciar a investigação sobre as necessidades educacionais desses educandos consiste em analisar as características de sua produção escrita. A partir disso fica mais claro quais deverão ser as intervenções pedagógicas mais adequadas a cada caso.
Levando em conta as necessidades surgidas no contexto escolar, a partir do momento em que os familiares chegam à escola para matricular a criança e a equipe toma conhecimento da situação, podemos perceber que a presença do profissional de psicopedagogia no ambiente escolar poderá contribuir para a transformação de diversas situações no contexto institucional. Uma dessas transformações poderia ser considerada em relação ao conceito de aprendizagem significativa (Ausubel, 1980), que demanda a necessidade do olhar individualizado em relação às aprendizagens dos educandos. A partir do olhar especializado, as ações implantadas nos contextos de aprendizagens poderão contribuir para minimizar ansiedades, seja do aprendente, do ensinante, dos demais integrantes da equipe escolar ou das famílias dos escolares diagnosticados com o TDAH. Certamente, a concretização de um ideal de educação de qualidade para todos poderá receber grandes contribuições decorrentes dos interesses de estudo provenientes da área da psicopedagogia.     
 



Bibliografia

AUSUBEL, David P.; NOVAK, Joseph D.; HANESIAN, Helen. Psicologia Educacional. Rio de Janeiro: Editora Interamericana, 1980.

DELL” Isola, Alberto. Mentes geniais. São Paulo: Universo dos Livros, 2011.

NUCCI, Guilherme de Souza. Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado. Rio de Janeiro: Forense, 2014.

ROTTA, OHLWELER, RIESGO (orgs). Transtornos da aprendizagem: abordagem neurobiológica e Multidisciplinar. Porto Alegre: Artmed, 2016.